Eduardo Agustinho*
As sementes estão plantadas, mas é preciso regá-las
O sucesso das startups curitibanas e como transformá-lo em mais “sementes”
Você conseguiria identificar, em até cinco segundos, ao menos duas características comuns de EBANX, MadeiraMadeira, Contabilizei, Olist, FBits e SmartHint? A resposta automática mais comum deve ser formada por um substantivo e um adjetivo: startups curitibanas.
As empresas mencionadas se encaixam perfeitamente na definição de “startup” cunhada por Steve Blank e Bob Dorf (2012), que se refere a organizações formadas para buscar um modelo de negócio escalável, repetitivo e lucrativo.
Ainda, quem mora na capital paranaense ou se interessa pelo assunto certamente já leu alguma matéria jornalística envolvendo a história de sucesso dessas startups curitibanas e dos empreendedores que as fundaram.
Se
fosse concedido um pouco mais de tempo, é provável que vários leitores incluíssem
uma terceira característica em comum para responder ao questionamento do
primeiro parágrafo, que é o fato de todas já terem recebido, em algum momento, aportes
de recursos de investidores externos aos seus negócios.
fosse concedido um pouco mais de tempo, é provável que vários leitores incluíssem
uma terceira característica em comum para responder ao questionamento do
primeiro parágrafo, que é o fato de todas já terem recebido, em algum momento, aportes
de recursos de investidores externos aos seus negócios.
Observa-se, porém, que os propósitos dos investimentos recebidos por essas startups não foram, necessariamente, os mesmos. FBits e SmartHint foram incorporadas a operações de outras empresas do mesmo seguimento — no caso, Locaweb e Magalu, respectivamente — em uma estratégia de busca de sinergia para ganhos de escala por parte das adquirentes.
Do outro lado, EBANX, MadeiraMadeira, Contabilizei e Olist receberam aportes de fundos private equity para manter tração em suas estratégias de crescimento. Esse é ocaso da entrada do fundo americano FTV no EBANX e do fundo japonês SoftBank Latin America nas demais.
O cenário vivido por essas startups curitibanas, que foram integradas a empresas maiores do mesmo mercado ou que aram a ter fundos de private equity em seus quadros societários, é exemplo vivo das externalidades positivas provenientes do ecossistema amigável ao empreendedorismo inovador que há na cidade.
Essas últimas etapas, de escalonamento e consolidação, podem ser compreendidas como aquelas nas quais estão os exemplos curitibanos mencionados, cada um em seu contexto próprio, naturalmente, dentro das respectivas trajetórias.
Estágio de mercado de investimento
Pode-se, ainda, entender que estágio de mercado de investimento vivido por essas empresas é aquele denominado de Venture Capital (VC), momento em que as startups que estão em estágios iniciais de maturação, mas que já atuam no mercado, geram receita e estão em busca de financiamentos para acelerar o seu crescimento.
Segundo a Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI), as startups podem estar em três fases de evolução: desenvolvimento, expansão e maturidade. O investimento realizado por fundos VC ocorreria na primeira etapa e poderia, ainda, ser subdividido em early e later stage.
O VC early stage seria aquele realizado em empresas com produtos ou serviços já testados no mercado, mas com no máximo quatro anos de existência e R$ 8 milhões de faturamento anual, enquanto o VC later stage representaria o investimento realizado em empresas que já atingiram a fase de comercialização plena do produto ou serviço e precisam de mais receita para expandir seus horizontes de atuação.
Por fim, o VC é um investimento operado através de fundos que atuam como intermediários entre investidores institucionais e empresas que tem por característica alto potencial de crescimento e que são baseadas em tecnologia.
Esse estágio do mercado para os empreendedores é um dos focos de atenção de políticas públicas para o incentivo ao empreendedorismo e inovação, visando, sobretudo, a sua sólida existência, de modo a permitir caminhos para que startups possam viabilizar ganhos de escala.
Um aspecto que precisa ser ressaltado e que não pode deixar de ser considerado nessa análise está no fato de que, na visão de muitos gestores dos fundos de VC, existe, em regra, no Brasil e em vários outros países, mais recursos disponíveis para investimentos do que startups prontas para recebê-los.
Isso não quer dizer que haja mais fundos querendo investir do que startups buscando investimento. O problema está na qualidade da oferta.
Os sete "T"s
Muitas empresas de negócios emergentes até têm bons produtos e entrada no mercado, mas não reúnem o conjunto dos sete "T"s que são procurados pelos investidores: time, tração, tempo para o mercado, tecnologia transformativa, total adaptabilidade ao mercado, e Ten Times Return no investimento realizado.
Ocorre que, muitas vezes, a não conjugação desses sete elementos decorre da falta de preparo dos fundadores do negócio para que ele ofereça seu melhor potencial.
Dentro dessa perspectiva, é evidente o caráter positivo do estímulo ao aumento de fundos de investimento VC e da demanda por bons negócios para o aporte de recursos, para que casos de sucesso como os mencionados sejam cada vez mais comuns.
Incubação e aceleração
Ao mesmo o, é preciso que sejam desenvolvidos mecanismos que propiciem a melhor qualificação do lado da oferta. Afinal, a existência de maior interesse no investimento só se tornará um aporte concreto se as startups propiciarem expectativas que justifiquem essa aposta no sucesso futuro do empreendimento.
É nesse ponto que o ecossistema de inovação, com a participação do Estado e da academia, ao lado das startups e das empresas, pode contribuir para a geração desse valor, com o fortalecimento de incubadoras e aceleradoras, organizações voltadas ao apoio dos empreendedores no trabalho de aprimoramento de suas ideias e negócios.
É nesse ambiente, geralmente na universidade, que se torna possível melhorar os processos que envolvem os estágios iniciais de maturação da startup anteriormente mencionados.
Dois pontos permitem entender que a melhora no ambiente em que estão inseridas startups curitibanas — e paranaenses no geral — já é uma preocupação presente, e que os meios para o fortalecimento desse sistema já estão sendo perseguidos.
Há proposições de políticas públicas que podem ser pinçadas da nova Lei de Inovação do Paraná, sancionada recentemente pelo Governo do Estado, e da Lei de Inovação de Curitiba.
No caso da legislação estadual, foi previsto um capítulo específico para o estímulo ao processo de inovação nas empresas e no terceiro setor, atribuindo ao estado, às universidades e agências de fomento o dever de promover e incentivar o desenvolvimento de inovações, prevendo o emprego do capital semente, da participação societária, de fundos de investimento e de fundos de participação, além de autorização para a formação de um fundo de investimento para inovação com a participação de recursos estaduais.
No mesmo sentido, a cidade de Curitiba prevê a formação de um fundo de investimento para a inovação por meio de lei municipal, o qual já foi instituído: Fundo de Inovação do Vale do Pinhão - Inova VP.
Encontra-se posta, portanto, a estrutura legal indutora do fortalecimento do sistema de incubadoras e aceleradoras nas universidades e demais estruturas de fomento à inovação em startups curitibanas.
Os mencionados fundos de investimento e participação que podem, por lei, ser iniciados com recursos públicos, oferecem condições para que, dentre outras medidas, incubadoras, aceleradoras e parques tecnológicos sejam subsidiados, ambientes a inovação e startups florescem. Esses verdadeiros agentes de inovação são os pontos de inflexão necessários para a melhora da formação técnica e de gestão dos empreendedores e de suas startups.
Possibilidade de retorno de investimentos
Mas o ponto principal da semente plantada pelas referidas leis não está nesse subsídio ao apoio técnico que poderá ser realizado por meio desses fundos às incubadoras, aceleradoras e parques tecnológicos a startups curitibanas.
Esse trabalho já existe nas universidades e vem buscando exercer o papel de apoio a empreendedores e startups.
O ponto nodal está, sim, na possibilidade de retorno de investimentos que esse modelo pode propiciar para estado, município e comunidade local.
Isso
ocorre porque, a partir da formação desses fundos de investimento,
viabiliza-se, para incubadoras e aceleradoras que recebam seus recursos como
apoio para suas atividades, a possibilidade de acordar com as startups, em seus
estágios iniciais, uma contrapartida à estrutura, mentorias e capacitação
oferecidas para os empreendedores, por intermédio de contratos de opção de
compra de participações societárias com as startups apoiadas em seus programas
de aprimoramento e aceleração.
ocorre porque, a partir da formação desses fundos de investimento,
viabiliza-se, para incubadoras e aceleradoras que recebam seus recursos como
apoio para suas atividades, a possibilidade de acordar com as startups, em seus
estágios iniciais, uma contrapartida à estrutura, mentorias e capacitação
oferecidas para os empreendedores, por intermédio de contratos de opção de
compra de participações societárias com as startups apoiadas em seus programas
de aprimoramento e aceleração.
Desta forma, nos casos de startups futuramente bem sucedidas no mercado de investimentos, as opções de compra de participação societária e a possibilidade de saída, com a alienação dessas participações e realização de resultados positivos, poderão ser exercidas pelos próprios fundos de investimento e participação que subsidiam as incubadoras e aceleradoras.
Esses recursos, por sua vez, vão gerar novos ciclos positivos de apoio a mais empreendedores, fortalecendo-se cada vez mais o papel do ecossistema de inovação na geração de novos empreendimentos inovadores de sucesso.
Regar a semente nas universidades
Por
fim, em uma visão sistêmica dessa possibilidade de criação de um ambiente
favorável ao florescimento de startups com potencial de escalabilidade, é
possível constatar, ainda, que esse modelo de operação pode ser realizado por universidades
mesmo sem a necessidade dos mencionados fundos com participação pública.
fim, em uma visão sistêmica dessa possibilidade de criação de um ambiente
favorável ao florescimento de startups com potencial de escalabilidade, é
possível constatar, ainda, que esse modelo de operação pode ser realizado por universidades
mesmo sem a necessidade dos mencionados fundos com participação pública.
Dentro
do atual quadro legal brasileiro, instituiu-se, no início de 2019, o estímulo à
criação de fundos endowment para apoio a instituições de interesse
público, públicas ou privadas sem fins lucrativos. É a Lei
dos Fundos Patrimoniais.
do atual quadro legal brasileiro, instituiu-se, no início de 2019, o estímulo à
criação de fundos endowment para apoio a instituições de interesse
público, públicas ou privadas sem fins lucrativos. É a Lei
dos Fundos Patrimoniais.
Seguindo o mesmo raciocínio dos fundos para a inovação instituídos com recursos públicos, constata-se que os fundos endowment, que se fortalecem tradicionalmente através de doações de ex-alunos, podem prever, entre seus objetivos com a universidade apoiada, o e a projetos de pesquisa, incubadoras e aceleradoras.
Pode ser estabelecido, como contrapartida, a previsão de acordos de opção de aquisição de participação societária com as startups que recebam e desse ambiente de inovação em sua caminhada.
Assim, as universidades apoiadas por esses fundos endowment têm a possibilidade de fortalecer sua atuação na geração da pesquisa e inovação, valendo-se do direito de usufruir de parcela do sucesso de empreendedores que amadureceram seus produtos e serviços com o apoio da academia.
Esse direito seria titularizado pelo fundo endowment, que dá e a essa atividade, o qual poderia exercer essa opção de compra de participações societárias, visando a realização dos resultados positivos.
Como visto, a semente está plantada. A legislação atual, a nível federal, estadual e municipal (nos casos do Paraná e de Curitiba), já permite o emprego dessas alternativas.
Cabe às universidades e Institutos de Ciência e Tecnologia (ICTs), públicos e privados sem fins lucrativos, o trabalho de jardinagem dessas sementes de possíveis novas startups curitibanas.
Que tenhamos cada vez mais exemplos de empreendedores e empresas atingindo a etapa do VC no ciclo de crescimento das startups.
E que as universidades percebam a sua oportunidade e importante papel na melhora da oferta de startups que viabilizem a conjugação dos sete "T"s, não só para a atração de investimentos, mas, sobretudo, para a melhoria da qualidade de vida daqueles que usufruem de seus produtos e serviços.
*Eduardo Agustinho é diretor do Instituto iPUR Cidades Inteligentes, da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUR), advogado atuante em Direito Empresarial e professor do Programa de Pós-Graduação em Direito (PPGD) também na PUR. Graduado em Direito, é Doutor em Direito Econômico e Desenvolvimento pela PUR e pesquisador visitante na Universidade Paris I Panthéon-Sorbonne e na Organização Mundial da Propriedade Intelectual (OMPI).