Mais recentemente, no entanto, o subprocurador vinha promovendo uma imagem bem mais alinhada com a de Bolsonaro, especialmente em temas morais. Em entrevistas e declarações feitas já quando era candidato à PGR, Aras se manifestou contrário à ideologia de gênero e à criminalização da homofobia da maneira como ela vem sendo conduzida no Supremo Tribunal Federal – em 2015, o então procurador-geral, Rodrigo Janot, deu parecer favorável à equiparação entre homofobia e racismo, posição defendida por um vice-procurador-geral no julgamento iniciado em fevereiro deste ano e encerrado em junho, e cujo resultado foi elogiado por Raquel Dodge. Esses posicionamentos recentes de Aras levaram a críticas também da esquerda, após a confirmação da indicação.

Se for aprovado pelo Senado, Aras também terá sob seu guarda-chuva a força-tarefa da Operação Lava Jato, sobre a qual manteve uma postura cautelosa. Em entrevista recente ao jornal O Globo, ele havia dito que as forças-tarefas em geral, incluindo a da Lava Jato, deveriam ser “incentivadas” e “fortalecidas”, mas também afirmou que havia “desvios”, dos quais o principal era o “personalismo” – no entanto, Aras evitou mencionar especificamente nenhuma força-tarefa ou procurador específico.

É possível que tenha havido uma mudança de mentalidade ao longo dos anos? Os apoiadores de Bolsonaro continuam suspeitando; o dilema é que só será possível saber ao certo qual a postura de Aras se ele for confirmado no cargo, do qual não terá como ser retirado pelos próximos dois anos. Em uma transmissão ao vivo feita nas mídias sociais na noite de quinta-feira, o presidente pediu um voto de confiança, às vezes deixando subentendido que espera de seus defensores um apoio incondicional a todas as suas decisões, porque as críticas abririam as portas ao retorno do petismo.

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Bolsonaro disse, na live, que “não basta apenas alguém que combata a corrupção. Tem que ser sensível a outras questões”, e é verdade que há outras pautas importantes – basta observar o caráter militante assumido pela Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão, comandada por Deborah Duprat, célebre defensora de causas ditas “progressistas”, mas que claramente ofendem a dignidade humana, como a legalização do aborto. Mas a fala dá a entender que Aras será firme contra a corrupção, quando uma das grandes preocupações dos bolsonaristas é justamente esta, e o que está em jogo não é apenas o futuro da Lava Jato.

É preocupante, por exemplo, que a nomeação tenha sido feita contra a vontade do ministro Sergio Moro (que preferia um integrante da lista tríplice), mas tenha sido endossada pelos filhos do presidente, incluindo o senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), investigado devido às movimentações suspeitas do ex-assessor Fabricio Queiroz. É o mesmo tipo de preocupação, aliás, que permeia algumas outras movimentações recentes, como a pressão de Bolsonaro sobre o atual diretor-geral da Polícia Federal, Maurício Valeixo, e a mudança do Coaf para o Banco Central, com a demissão de Roberto Leonel – tanto Valeixo quanto Leonel foram indicações de Moro, e o Coaf foi o órgão de onde vazaram as informações sobre Queiroz e Flávio.

Não bastará ao futuro procurador-geral mostrar trabalho no campo dos temas morais ou econômicos; Aras terá de ser implacável no combate à corrupção, ainda que isso signifique desagradar pessoas próximas ao presidente, e sem criar empecilhos à Lava Jato. Enquanto isso não se concretizar, apenas o voto de confiança não bastará para que as suspeitas dos bolsonaristas se dissipem.

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