“Acerca da terapia medicamentosa, entendo que o CFM deve recomendar aos médicos que usem os chamados medicamentos antroposóficos com extrema cautela, evitando abandonar terapêuticas já sedimentadas, por alternativas desprovidas de experimentações baseados nos métodos científicos”, alerta o parecer. 3q1550

Homeopatia b3u4l

O que é? Mais uma terapia holística abarcada pelo Ministério da Saúde, a homeopatia é descrita pela pasta como uma abordagem que “vê a pessoa como um todo, não em partes”, cujos tratamentos se baseiam “em sintomas específicos de cada indivíduo e utiliza substâncias altamente diluídas que buscam desencadear o sistema de cura natural do corpo.”

O que diz a ciência: Em 2005 a revista científica The Lancet publicou um editorial pedindo pelo fim da homeopatia. O texto criticava duramente a prática, e trazia os resultados de um estudo que comparou 110 testes de medicamentos homeopáticos com outros 110 testes de medicamentos convencionais. A pesquisa concluiu que onde houve resultados positivos com a homeopatia, isso se devia ao efeito placebo — o nível de recuperação esperado por conta da mera expectativa de melhora, e do conforto psicológico de crer-se tratado, e que é independente da eficácia objetiva da medicação.

Resultados semelhantes foram encontrados em estudos realizados na Austrália, e nos Estados Unidos uma agência federal de proteção ao consumidor determinou que medicamentos homeopáticos incluam em seus rótulos a informação de que não há prova válida de sua eficácia. No Brasil, o Ministério da Saúde comemora no 21 de novembro o Dia da Homeopatia.

Constelação Familiar 712i2a

O que é? Criação do psicoterapeuta alemão Bert Hellinger nos anos 1980, a Constelação Familiar é apresentada pelo Ministério da Saúde como uma “abordagem sistêmica, energética e fenomenológica” que visa “encontrar a ordem, o pertencimento e o equilíbrio” entre os membros de uma família. Quando a vida dos indivíduos segue as “ordens do amor”, reforça o texto, a vida flui de modo equilibrado e harmônico; já a transgressão de tais leis pode levar à “perda da saúde, da vitalidade, da realização, dos bons relacionamentos, com decorrente fracasso nos objetivos de vida.”

O que diz a ciência: Classificada pelo próprio criador como uma terapia fenomenológica, a Constelação Familiar não encontra amparo em quaisquer estudos que possam comprovar sua eficácia. Tal fato foi notado pela Ordem dos Psicólogos de Portugal, que em 2019 emitiu um parecer no qual não reconhece esse tipo de tratamento como algo enquadrado no campo da psicologia.

“Resulta claro da inexistência de informação e, particularmente, de evidência científica, que as ‘Constelações Familiares’ não constituem um modelo terapêutico reconhecido pelas ciências psicológicas. Não há informação e muito menos estudos científicos que permitam compreender exatamente o que é e como funcionam essas constelações familiares, ou como se avalia sua eficácia. (...) As constelações familiares não apresentam enquadramento científico, teórico ou acadêmico, nem socioprofissional, não havendo referência à formação idônea na área, nem qualquer tipo de regulamentação profissional”, destaca o documento.

Pensamento similar aos dos profissionais da Polônia. Por lá, um estudo de 2011 já deixava claro que o método das Constelações Familiares não preenche requisitos básicos do Código de Ética dos Psicoterapeutas, “o que faz com que seja difícil tratar esse método como uma terapia”.

No Brasil a prática é incentivada inclusive pelo Judiciário, que vem usando as constelações em casos como o de uma mãe que pedia a internação compulsiva da filha, dependente química. Por usar técnicas de atuação e representação, a sessão mediada pelo juiz da Vara Cível de Valença, próxima a Salvador-BA, acabou tendo uma situação no mínimo insólita: um dos presentes foi escalado para interpretar a pedra de crack, objeto de vício da jovem.

Imposição de Mãos 234619

O que é? Presente em terapias como o reiki, a prática terapêutica da imposição de mãos é descrita no rol das PIC como “um esforço meditativo para a transferência de energia vital (Qi, prana) por meio das mãos com intuito de reestabelecer o equilíbrio do campo energético humano, auxiliando no processo saúde-doença.”

O diz a ciência: Um grupo de pesquisadores canadenses e norte-americanos visitou a China no fim da década de 1970 para investigar os poderes de um certo doutor que curava seus pacientes pela transferência de qi (pronuncia-se chi), a energia vital, por meio das mãos. Em um primeiro momento, a interação entre médico e paciente se deu em um mesmo ambiente, com o Dr. Lu manipulando a energia vital a dois metros e meio da paciente, que se contorcia em convulsões a cada movimento do mestre.

Para colocar o método à prova, os pesquisadores colocaram médico e paciente incomunicáveis e em salas separadas, e condicionaram as interações do Dr. Lu ao resultado de um “cara e coroa” de uma moeda lançada. Por quatro lançamentos seguidos, o mestre não efetuou nenhuma manipulação de energia vital. Neste mesmo momento, a paciente em outra sala ava por convulsões intensas. Quando o acaso fez com que Dr. Lu pudesse mandar seu qi para a paciente, ela permaneceu estática. A experiência é descrita em detalhes no livro “The Hundredth Monkey: And Other Paradigms of the Paranormal”, editado por Kendrik Frazier.

Dez anos depois a jovem estudante Emily Rose, então com apenas 11 anos de idade, publicou um estudo científico no qual demonstrava que os praticantes do “toque terapêutico” simplesmente não conseguiam detectar a energia emanada por outras pessoas. O experimento comandado por ela foi simples e direto, e realizado em uma feira de ciências da escola onde estudava.

Separados por um anteparo, os sensitivos tinham que tentar sentir com as mãos o campo energético de outras pessoas, sem saber se havia alguém ou não do outro lado. Deixada ao acaso, a probabilidade de acerto se tinha ou não uma pessoa na sala seria de 50%. Os resultados dos praticantes de toque terapêutico foram piores, com 44% de acerto.

CFM e Ministério da Saúde 174f3y

Em 2018, o Conselho Federal de Medicina se posicionou contra a adoção das PIC ao rol de tratamentos oferecidos pelo SUS, alegando que tais práticas não apresentavam resultados e eficácia comprovados cientificamente. “A decisão de incorporação dessas práticas na rede pública ignora prioridades na alocação de recursos do SUS”, informava a nota do CFM, que também afirmava que “a prescrição e o uso de procedimentos e terapêuticas alternativos, sem reconhecimento científico, são proibidos aos médicos brasileiros”.

Procurado pela Gazeta do Povo, o CFM afirmou que mantém a posição tomada quando da incorporação das práticas integrativas complementares pelo Sistema Único de Saúde. Questionada se o CFM havia mudado de opinião em relação à homeopatia, reconhecida pelo conselho como especialidade médica desde 1980 e ainda carente de confirmação científica em seus métodos, a assessoria de imprensa confirmou que o conselho segue endossando a prática.

O Ministério da Saúde foi procurado para comentar os investimentos de recursos públicos em tratamentos sem embasamento científico, mas não respondeu aos questionamentos até a publicação da reportagem.

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